27 de fevereiro de 2011

Encontrando a calma em meio ao caos familiar

No turbulento momento do acesso de raiva, rebeldia e conflitos de nossos filhos, nós podemos aprender e crescer.
Por Lynne Jackson
Minha filha menor, Bethany, berrou por dez minutos, “Nada de dentes escovados! Não, não, não!”. Mais um ataque de raiva. Uma coisa tão simples como escovar os dentes era uma tortura para ela. Seu irmão mais velho gritou, “Cala a boca!”, e tentou tapar a boca dela. Ela gritou mais alto ainda. As veias do meu pescoço incharam enquanto eu gritava com os dois. Tinha sido um incidente isolado, eu ficaria bem. Porém, esse estilo de vida se tornou comum. Nessa vez, nós estávamos atrasados para deixá-los na casa da avó deles por um tempo... quem sabe por um mês? Por quê cuidar de filhos é tão difícil ?!?! Eu lamentei novamente.
Antes de meus filhos nascerem, minha vida era calma e agradável. Eu havia tomado posições de liderança no trabalho e na igreja. Eu tinha mais amigos do que minha agenda podia comportar, alguns admitiam que se assustavam pelo fato de eu ter tudo isso ao mesmo tempo. Eu mantinha minha casa arrumada e organizava meu tempo com eficiência. O auge do meu sucesso foi ser nomeada “empregada do ano” em um grande centro de reabilitação.
Depois eu tive filhos, e eles não se impressionavam mais.
Assim que meu controlado e previsível modo de vida colidiu diariamente com três crianças sensíveis e hiperativas, eu me vi em uma bagunça de difíceis, até mesmo sombrios, pensamentos e sentimentos que fizeram o ofício de mãe parecer impossível. Raiva, frustração, e até mesmo  violência, se tornaram todas companhias familiares. Eu lembro claramente do dia em que eu deitei de cara no carpete em desespero e lágrimas.
Minha fachada de realização e controle tinha ruído. Eu enfrentei um verdadeiro teste de fé. Eu poderia aprender a ser serena e confiante mesmo quando meus filhos estavam fora de controle? O Dr. John Gottman, psicólogo e estudioso da família, afirmou sabiamente, “O caminho para se tornar um melhor pai (ou mãe) – como a maioria dos caminhos para o crescimento pessoal – começa com a auto-avaliação”.
Nos meses e semanas seguintes, eu orei, anotei e procurei por conselhos sábios. Nesse processo, eu comecei a entender que meus desafios eram uma oportunidade para crescer pessoal e espiritualmente além de tudo aquilo que eu havia vivido! Apesar de não ser uma fácil jornada, eu sabia que era o caminho certo. Eu desenvolvi algumas frases para manter minha perspectiva refrescada durante esses tempos trabalhosos:
. Meus filhos foram criados por uma razão específica e são uma benção para mim!
. Nós estamos em uma ótima jornada pesar de nossos altos e baixos
. Deus vai usar todas as dificuldades para todos os seus bons e sábios propósitos
. Eu posso estar bem mesmo quando meus filhos não estão
Eu decidi que a tarefa mais importante que eu tenho como mãe é colocar esses pensamentos em prática. Essa disciplina foi mais importante que qualquer palpite sobre cuidados maternais que eu podia aprender. Passo a passo, minha ansiedade diminuiu e minhas reações se tornaram mais racionais – até mesmo gentis. Quando as crianças têm suas inevitáveis brigas e desequilíbrios emocionais, eu aprendi a parar, respirar, e lembrar das “frases”. Eu poderia, então, descansar e lidar com meus filhos com um pouco mais de sabedoria e menos ansiedade.
No turbulento passeio pelo acesso de raiva, rebeldia e conflitos de nossos filhos, nós podemos aprender e crescer. Quando nós deixamos de lado nossas preconceituosas noções de cuidado maternal e controle, nós crescemos em liberdade para amar nossos filhos pelo que eles são e aproveitar a divertida estrada do cuidado maternal.

Lynne Jackson mora em Minnesota e é mãe de adolescentes. Ela e seu marido são escritores, educadores de pais e co-fundadores do ministério Famílias Conectadas.
Encontrando a calma em meio ao caos familiar
“O caminho para se tornar um melhor pai (ou mãe) – como a maioria dos caminhos para o crescimento pessoal – começa com a auto-avaliação”. Dr. John Gottman, psicólogo
 

20 de fevereiro de 2011

Bênçãos no sofrimento

Joni Eareckson Tada diz que o cristão precisa entender o propósito de Deus nas dificuldades.
Por Sarah Pulliam Bailey

Joni Eareckson Tada ficou mundialmente conhecida nos anos 1970 como ativista em luta permanente pelos direitos e pela qualidade de vida das pessoas portadoras de deficiência física. À frente do ministério Joni e Amigos, surgido após drama pessoal – na adolescência, um mergulho imprudente em águas rasas deixou-a tetraplégica –, ela percorre o mundo em sua cadeira de rodas, oferecendo esperança e muito mais a gente que, como ela, tem de atravessar a vida sofrendo com sérias limitações. Até hoje, sua instituição já distribuiu mais de 50 mil cadeiras de rodas, além de aparelhos ortopédicos, próteses e todo tipo de auxílio a deficientes físicos, sobretudo nos países mais pobres. Além, é claro, da palavra de esperança e salvação do Evangelho, mensagem de que Joni nunca abriu mão de anunciar.
Autora do livro testemunhal Joni, uma histeria inesquecível, sucesso em todo o mundo, ela tem sido vista como exemplo de superação e fé. Só que agora um novo drama se abateu sobre a vida dessa frágil mulher de 60 anos: o diagnóstico recente de um câncer de mama. A doença veio se somar a uma dor crônica que a vem atormentando há uns dez anos. Parecendo otimista e confiante após uma cirurgia oncológica, ela rejeita comparações com Jó, ícone do sofrimento na Bíblia, mas admite que, por vezes, não sabe o que pensar acerca de um Deus que, conforme a crença evangélica, tem poder para curar todas as enfermidades do corpo e da alma. “Qualquer cristão luta para entender o propósito de Deus na dificuldade”, diz. “Lembro sempre da passagem de I Pedro 2.21: ‘Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus passos.’”
Joni falou com CRISTIANISMO HOJE sobre seu livro mais recente, A place of healing: Wrestling with the mysteries of suffering, pain and God´s sovereignty (ainda inédito em português, a tradução literal do título é “Um lugar de cura: Lutando com os mistérios do sofrimento, da dor e da soberania de Deus”), da editora David C. Cook. Longe de ser um memorial de lamúrias, a obra descreve sua teologia do sofrimento.

CRISTIANISMO HOJE – O quanto sua perspectiva sobre sofrimento e cura mudou desde o diagnóstico do câncer?
JONI TADA – Felizmente, não mudou de forma alguma. Diante de situações assim, você examina a Escritura novamente e segue todas as passagens referentes à cura. Fiz isso com a minha quadriplegia, há mais de 40 anos, e de novo dez anos atrás, quando passei a experimentar uma dor crônica. Há um mês, ao receber o diagnóstico de câncer de mama, olhei para esses mesmos textos da Escritura, e as palavras de Deus não mudam. Embora a impressão seja a de que muita coisa tenha sido acumulada, continuo pensando em I Pedro 2.21: “Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus passos.” Esses passos, na maioria das vezes, conduzem os cristãos não a intervenções miraculosas ou divinas, e sim, diretamente à comunhão do sofrimento. É um bom princípio básico para qualquer cristão que luta para entender o propósito de Deus na dificuldade.

E a relação com Deus, como fica?
De certo modo, tenho sido atraída para mais perto do Salvador. Há coisas sobre o seu caráter que eu não via. Isso me diz que ainda estou mudando, crescendo, sendo transformada, e me tornando mais como ele. Jesus disse que quem tivesse fé nele, faria coisas ainda maiores do que as que ele fez. Somos inclinados a pensar que Jesus estava falando sobre milagres – mas, não necessariamente. Ele estava oferecendo o Evangelho; estava fazendo avançar o seu Reino; estava reivindicando a terra como sua, por direito. Então, quando fez essa promessa, o Salvador deu a todo crente a capacidade de também fazer isso.  É isso o que tenho visto no último mês. É incrível a quantidade de pessoas sedentas por Cristo que tenho encontrado, desde médicos a enfermeiros, e todo o pessoal técnico dos centros médicos onde sou tratada. Eu sei que isso era verdade antes, mas parece haver algo especial acompanhando esse diagnóstico. A todos, tenho falado de confiança no amor de Deus por nós.

Impossível deixar de fazer a pergunta clássica. Na sua opinião, como um Deus bom permite que as pessoas, mesmo as que creem nele de todo coração, sofram tanto?
Quem faz essa pergunta – e eu mesma luto com ela – não está aceitando o fato de que este mundo está comprometido. Vivemos em um mundo caído. Quando não experimentamos o sofrimento, isso é uma exceção. O princípio básico é o de que experimentaremos muito sofrimento, porque vivemos em um mundo que geme sob o peso de uma pesada maldição. Se ser bom, para Deus, significa dar cabo do pecado, então ele teria de dar cabo dos pecadores. Mas o Senhor é um Deus de grande generosidade e enorme misericórdia, de modo que permite o curso do sofrimento. Ele não o detém até que haja mais tempo para amealhar mais pessoas para o aprisco da comunhão de Cristo.

Existem sofrimentos que vêm por causas naturais e outros que são provocados pela ação humana, ou seja, entre as diferentes causas da dor, em muitas delas a vítima nada podia fazer para evitá-las. Que tipo de sofrimento é mais fácil de aceitar?
Sofrimento é dificuldade e pesar. É tudo um pacote só. Sim, Deus poderia evitar o sofrimento. Pode, por exemplo, impedir que um assaltante atire contra a vítima ou evitar o surgimento de um tumor. Se ele escolhe permitir que essas coisas ocorram, isso não quer dizer que seja menos cuidadoso ou compassivo. Sua vontade, seu propósito e seu plano soberano podem ser um pouco mais obscuros e enigmáticos deste lado da eternidade. Quer a dificuldade seja resultado de negligência de quem a enfrenta ou fruto da ação direta de uma outra pessoa, ou, ainda, de uma catástrofe natural, é preciso lembrar que todas essas coisas estão ao alcance da soberania divina. Um olhar mais atento sobre o Novo Testamento mostra que a soberania de Deus se estende sobre todas as coisas – e ele permite todos os tipos de coisas, mesmo aquelas que não aprova. Ele não aprova, por exemplo, minha lesão medular ou o meu câncer, mas em sua soberania ele os permitiu. Não me importo se o termo usado for “deixar”, “permitir” ou “ordenar”. É tudo a mesma coisa. No final das contas, tudo se resume ao fato de que Deus está no controle. Não penso que haja uma diferença prática.
Bênçãos no sofrimento
Joni, presa à cadeira de rodas há mais de 40 anos, agora enfrenta o drama do câncer com confiança: “Soberania de Deus”.
 

12 de fevereiro de 2011

Solidão e solidariedade

O pastorado é chamado para uma caminhada, muitas vezes, solitária.
Um querido pastor e mestre, recentemente falecido, dizia que pastorado é o chamado para uma caminhada, muitas vezes, solitária. Não se trata de uma declaração nova e nem surpreendente, mas, vindo de uma pessoa muito experimentada e que sempre conviveu na realidade das igrejas, expressa a realidade. Também tenho experimentado isso por diversas ocasiões, em muitos anos de andanças servindo ao Reino de Deus como missionário e pastor.
Solidão é o caminho que nos isola. É trilha inversa ao que chamamos de solitude, que é a decisão intencional de estar a sós para orar, refletir, meditar – trata-se de uma disciplina espiritual, inclusive recomendada na construção de uma espiritualidade cristã. Disciplina esta, porém, que nos chama, depois de experimentada, à experiência comunitária, à integração e à doação mútua, diferentemente da solidão.
A solidão é o caminho desejado, por vezes voluntariamente – e equivocadamente – pelo próprio ministro do Evangelho. Ou é a realidade que se apresenta pelas circunstâncias, num modelo de vivência e prática da vocação, dentro da própria estrutura eclesiástica ou institucional, quando sentimentos de competição, busca pelo poder e influência religiosa propiciam a superficialidade e a fragilidade de possíveis amizades. Solidão é também o caminho possível para homens e mulheres que têm temperamentos mais introspectivos ou tímidos.
Muitos modelos contemporâneos de pastorado, construídos dentro de estruturas organizacionais e corporativas e baseados no crescimento da obra, têm alimentado esse caminho de solidão. Quando líderes ou pastores têm de apresentar resultados para merecerem reconhecimento, dificilmente serão construídas amizades sinceras e duradouras. A solidão, então, torna-se um caminho de proteção, uma espécie de blindagem contra traumas e decepções. Solidão leva ao medo, à desconfiança, ao desencanto e ao desencorajamento para o exercício do ministério e a participação na obra de Deus.Solidão é também uma realidade vivida por muitos obreiros no contexto onde foram servir e trabalhar; é consequência natural de circunstâncias que não desejaram, mas que encontraram no campo no qual se instalaram.
Solidariedade, porém, é um caminho que se contrapõe ao caminho da solidão. O evangelista John Wesley dizia que fomos chamados para viver uma fé solidária e não solitária. A solidariedade é opção promissora para não sermos ministros solitários; é também motivação para que o ministério pastoral influencie cada ovelha a olhar com outros olhos a realidade na qual está inserida e cada comunidade cristã a praticar a justiça e a agir na sociedade com obras de amor, socorro e misericórdia. A solidariedade deve rechear nossa agenda religiosa, de modo que andemos na direção do Deus Trinitário e do próximo, em comunhão e edificação.
A solidariedade vai sendo construída e exercitada quando abrimos espaço para irmãos chegarem mais perto de nossos corações e famílias. É solidariedade que encoraja e incentiva os outros nascidos da fé a construírem relacionamentos sinceros conosco, acolhendo nossa humanidade e autenticando a verdade e sinceridade de nosso chamado. Assim serviremos juntos enfrentando o desafio de sermos igrejas que sinalizem o reino, e também o poder do Evangelho transformador de Jesus Cristo.
Solidariedade é encorajada por Tiago, quando escreve que a nossa adoração horizontal deve nos encorajar a sermos praticantes da Palavra, e não somente ouvintes. Viver apaixonadamente a implantação do Reino de Deus é anunciar a salvação em Cristo através de obras de amor, socorro e misericórdia, cuidando da causa dos órfãos, das viúvas, dos que estão sem voz e esperança, numa vida de santidade, conforme Tiago 1.27. Solidariedade é um caminho desejável para todo ser humano, e fundamental para pastores e líderes.
A missão do Evangelho é para todos os que confessam a Jesus como Senhor e Salvador, com seus dons, talentos e profissões, e não somente para pastores e missionários. E a solidariedade é o caminho que nos faz aproximar de outros, facilitando nossa jornada e ajudando o ministro e a Igreja ser menos solitária e mais solidária, propiciando inclusive oportunidades enquanto servimos de construirmos excelentes amizades, amigos mais chegados que irmãos, conforme diz a própria Escritura. A solidariedade facilita e propicia que a compaixão se instale em nossas emoções, e faça parte de nosso estilo de vida. Solidariedade faz parte do coração pastoral de um Deus Triúno que é comunidade, comunitário e solidário, e que veio ao nosso encontro!

NELSOM BOMILCAR